Problemas para engolir alimentos líquidos e sólidos atingem todas as
idades. Mas chamada disfagia orofaringica não é uma condição em si, mas
um sintoma de outros problemas de saúde.
“A disfagia é a dificuldade de levar os alimentos da boca até o
estômago. Apesar da ideia comum de que esse transporte é algo simples – é
só engolir – esse processo de deglutição envolve vários orgãos do
corpo, já que engolir algo não se dá pela força da gravidade mas dos
movimentos peristálticos que empurram o alimento para o estômago”,
explica Roberta Gonçalves, fonoaudióloga que coordena o Departamento de
Disfagia da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia (SBFa).
“A disfagia não é só uma questão que envolve mastigação, mas também
orgãos das vias aéreas superiores, que dividem suas funções com a
respiração também. O principal perigo da disfagia é quando líquidos e
sólidos se desviam do seu caminho natural e vão parar no pulmão”,
completa Roberta que é pesquisadora ligada à Universidade Estadual
Paulista (Unesp) de Marília.
Aumento do risco de morte
A disfagia pode levar, por exemplo, à infecções diversas no pulmão.
Entre elas está o risco de pneumonia. As infecções nas vias aéreas
superiores – das quais faz parte o pulmão – são uma das principais
causas de óbito em idosos hospitalizados. Mas a idade não é um
determinante. Bebês também podem ter problemas de disfagia, e correm os
mesmos riscos de morte de idosos.
“Crianças pequenas que têm muitos problemas respiratórios, como
gripes e resfriados constantes e pneumonias, podem não ter doenças
pulmonares, mas sim algum tipo de disfagia. Pais que afirma que seus
filhos ‘estão sempre resfriadinhos’ precisam estar atentos para
condiçoes não diagnosticadas – como síndrome genéticas – que podem estar
levando a esse quadro de problemas respiratórios”, alerta a
especialista.
Disfagia em adultos pode estar relacionada com câncer de cabeça e pescoço
Algumas condições de saúde estão associadas diretamente à disfagia ou
problemas de deglutição. No caso dos Acidentes Vasculares Cerebrais (o
AVC ou o popular “derrame”) a disfagia é encontrada em 97% dos casos. O
AVC é mais comum em indivíduos adultos ou idosos, especialmente aqueles
com vida sedentária, tabagistas e cuja alimentação passa longe da
saudável (com grande consumo de gorduras saturadas, por exemplo).
Outras condições neurológicas, também mais incidentes em pessoas mais
velhas, estão associadas à deglutição comprometida. A Doença de
Alzheimer e o Parkinson, são exemplos. “Engolir é um ato involuntário
que é controlado pelo cérebro. Qualquer problema neurológico,
especialmente aqueles que compromentem a movimentação e o controle dos
músculos, pode causar a disfagia”, diz a especialista.
Adultos que estão fora da faixa de risco para essas doenças
neurodegenerativas, mas que sofreram algum tipo de trauma encefálico
(como aqueles em acidentes automobilísticos) também têm um alto risco de
desenvolver a disfagia.
Já quando o assunto são os câncer de cabeça e pescoço – uma lista
longa que pode atingir vários orgãos nessa região – a disfagia está
presente em 100% dos casos.
“Se há essa dificuldade de engolir e ela está se agravando, com
engasgos frequentes ou desvio do alimento, pode haver um câncer de
cabeça e pescoço se instalando”, observa Roberta.
Não só engasgos e problemas de pulmão: disfagia também pode levar à desnutrição
A desnutrição causada pela disfagia é comum em indivíduos idosos e
nas crianças. No primeiro caso, o AVC e outras condições neurológicas
são um desafio para os familiares e, portanto, quando esses voltam para
casa após alguma intervenção hospitalar é preciso dobrar a atenção.
“A alimentação, nesses casos, compreende todo um processo de
readequação das rotinas. Os idosos comem mais devagar, engasgam e por
ser cansativo ou pelo fato de haver pouco ou nenhum prazer na
alimentação eles podem comer cada vez menos. Os cuidadores precisam
estar atentos para essa nova dinâmica e sempre ficar atentos ao nível
ideal de ingestão alimentar”, diz Roberta.
No caso das crianças, em especial daquelas em idade onde a
verbalização ainda não está presente, novamente é preciso atenção
redobrada. “Problemas para deglutir causam traumas e essas crianças vão
deixando de se alimentar corretamente”, alerta.
Diagnóstico difícil e falta de preparo de profissionais médicos
Além do risco de morte, pode trazer problemas pulmonares e
nutricionais a disfagia também aumenta – em muito – os custos de uma
internação. Isso porque pessoas com problemas para deglutir podem acabar
precisando de sondas de alimentação, um conjunto de aparelhos que evita
a total desnutrição do paciente ao custo que pode variar dos R$ 3 aos
R$ 4 mil por mês.
Para evitar esse aumento nos custos de internação o ideal é
diagnosticar o mais rápido possível a disfagia e contar com um
profissional de fonoaudiologia na equipe multidisciplinar que atende
pacientes com o risco da disfagia ou com o problema já instaurado.
Mas muitos profissionais médicos e de enfermagem não conseguem
reconhecer os primeiros indícios da disfagia. Pior: alguns profissionais
de saúde ainda se valem de uma metodologia de diagnóstico precária e
datada, ao invés de uma análise clínica acompanhada pelo profissional de
fonoaudilogia.
“Há muitos anos atrás o diagnóstico para uma possível disfagia era
feita fazendo com que o paciente ingerisse uma certa quantidade de
gelatina, um alimento pastoso que é relativamente fácil de engolir. Caso
o paciente tivesse acessos de tosse, ele provavelmente estava sofrendo
com a disfagia. Primeiro, o método é, convenhamos, arcaico. Segundo,
trazia riscos para a saúde do paciente pois, caso ele estivesse com
problemas de deglutição a gelatina poderia parar no pulmão, gerando uma
infecção”, explica Roberta.
“Os protocolos atuais determinam que a avaliação deve ser feita por
uma equipe multidisciplinar e que tenha, necessariamente, um
profissional de fonoaudiologia. Isso já é lei inclusive para pacientes
com AVC e em maternidades. Mas não para todas as condições que incorrem
no risco da disfagia, ainda. Então depende-se muitas vezes da
sensibilidade e preparo do profissional médico para pedir presença do
fonoaudiólogo. Esperamos que isso mude no curto prazo”, indica Roberta.
“Uma boa avaliação e uma intervenção para a reversão do quadro da
disfagia é, comprovado pelos diversos estudos feitos no Brasil – e cujas
pesquisas na área é reconhecida mundialmente – a melhor forma de
proteger os pacientes de pioras na sua saúde como um todo”, finaliza a
pesquisadora.
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por Enio Rodrigo
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